10 metros de altura
Decidi
colocar no ar este “matungão especial” pelo fato de sentir a necessidade de ter
espaço para escrever sobre um dos melhores amigos que tive em meus 40 anos de
ligação com o turfe. No blog semanal não teria como. Aliás, por falar na
coluna, quando a criei, no jornal O Povo, em 1984, nos mesmos moldes de hoje,
com estes mesmos tópicos, contei com o apoio e o incentivo deste amigo. Que,
aliás, me incentivou em tudo que fiz ou tentei fazer. Na época, quis prestar
uma homenagem a Haroldo Barbosa e seu “Pangaré”. Tive a honra de trabalhar com
Haroldo em O Globo e decidi criar a coluna. Minha entrada no jornalismo
aconteceu às avessas, pois comecei a trabalhar no jornal antes mesmo de fazer a
faculdade. Resumindo, minha paixão pelo turfe me fazia querer ser tudo, menos
jóquei (já era um pouco pesado). O que gostaria de deixar claro aqui é que em
tudo que fiz, jornalismo, locução e treinamento de cavalos, contei com o apoio
e o incentivo de Ernani Pires Ferreira. Sempre me dizia que fazendo o que se
gosta, certamente conseguiríamos bom resultado. O talento é nato, mas a
dedicação e o profissionalismo são fundamentais. Aprendi muito com ele, o
profissional e mais ainda com o ser humano. Enaltecer o locutor (fantástico) é
fácil, todos são testemunhas. Mas Ernani ia além.
Atitudes
de um homem iluminado
Pensei
muito antes de escrever sobre isso, pois além de ser assunto extremamente
pessoal, me trás lembranças tristes, mas é preciso que todos saibam que Ernani
era muito mais que um craque na profissão. No início de 2001 minha mãe foi
diagnosticada com câncer e teve início uma luta insana. Mulher inteligente e forte, embora encarasse a doença de frente, se abateu e aos poucos foi
perdendo a alegria. Mas, uma pessoa a fazia sorrir, por telefone e pessoalmente
nas visitas que fazia. Quando o telefone tocava e ela atendia com um sorriso no
rosto eu logo imaginava: “é o Ernani”. Sim, ele esteve ao nosso lado até o fim
e segurou minha barra por um bom tempo. Posso também lembrar de que fez o mesmo
em relação à minha tia, tanto que meu primo-irmão Felipe Forzley, que não tem
nenhuma ligação com o turfe, adorava o Ernani e até fez inúmeras fotos dele e
da equipe (meu primo entre outras coisas é fotógrafo premiado). Além de ser um
amigo iluminado, tinha passado pela mesma coisa com um dos grandes amores de
sua vida, a saudosa Vivi, que sofreu com a mesma doença. Aquele baixinho de
1,61 parecia ter 10 metros de altura e tirava forças não sei de onde para
buscar palavras que, ao menos, amenizavam o momento difícil de encarar.
Um ser bem
humorado e altamente profissional
A
irreverência de Ernani, sempre brincando e fazendo piada, poderia passar uma
imagem um pouco diferente da realidade. Ele foi uma das pessoas mais
organizadas que conheci na vida. No meio da semana ia ao hipódromo pegar os
programas oficiais (sempre pegava dois de cada) para já ter contato com os nomes
dos animais inscritos. Certa vez, na diretoria do Senac, onde trabalhou por 18
anos, vi em sua sala uma quantidade incontável de pastas completamente
alinhadas, por ordem alfabética. Onde morou, tudo no lugar certo. Ele sabia
encontrar qualquer coisa. Uma vez deu um conselho ao treinador Valtemir Pedersen:
sempre leve duplicata de qualquer coisa. Se uma falhar, você tem outra para
resolver. E o Junior até hoje lembra disso e utiliza. Seu livro Guardanapos de
Papel conta um pouco de sua história, mas garanto que mesmo querendo parecer não
gostar de muitas coisas que citou, por vezes ele curtia.
Reconhecimento
justo num ótimo trabalho
Num
trabalho maravilhoso feito pelo repórter e amigo Victorino Chermont, Ernani
contou um pouco de sua vida em programa mostrado em outubro do ano passado pelo
Sportv. Victorino, turfista, amigo e admirador de Ernani, preparou uma matéria na qual o pernambucano continuava irradiando sua irreverência. Era tão detalhista que alguns
podem não lembrar, mas em dado momento, quando falava sobre a criação de um de
seus mais famosos jargões “Lá Vem o Juvenal”, um passarinho cantou e ele,
prontamente, interrompeu o assunto e disse: “bonito isso”. Por falar em
televisão, sua passagem pelo Globo Esporte, durante uma década, foi marcante.
As crianças o reconheciam na rua e brincavam com ele. Também teve sua temporada
no programa de José Carlos Araújo (seu amigo pessoal) aos domingos. Se for
escrever sobre tudo que Ernani fez precisaria de umas dez colunas destas.
Frase que não esqueço
“Faça seu trabalho com total
profissionalismo, receba seu dinheiro no fim do mês e vá curtir a vida” (Ernani
Pires Ferreira)
O
MATUNGÃO VIBROU
Creio
que foi em 2005, não lembro bem. Luiz Carlos estava de folga e Ernani passou
mal. Era um sábado e eu estava em casa, de bermuda, assistindo as corridas.
Recebi uma ligação de Urubatan Medeiros pedindo que fosse narrar. Não fazia
aquilo há pelo menos 20 anos e só havia transmitido corridas pelo rádio. Enfim,
fui correndo e encarei dois páreos até o Luiz chegar. Ficou nisso. Mas, dois
anos depois recebi uma ligação do Ernani dizendo que me queria a seu lado e ao
lado do Luiz. De início relutei, mas diante da insistência dele acabei
aceitando e no dia 28 de setembro de 2007 entrei para o time. Confesso que no
início ainda estava um pouco inseguro, mas contei com total apoio dos amigos.
Me recuso sempre a aceitar quando dizem que eu substitui Ernani. Não foi o caso
e embora digam que ninguém é insubstituível, o baixinho é uma exceção à regra.
Ernani foi único em tudo que fez. Como locutor, como ser humano, como amigo.
Escreveu seu nome na história do turfe, na história da vida. Ajudou um
incontável número de pessoas e jamais fez propaganda disso. Fazia doações a
instituições de caridade, todo ano praticamente limpava o guarda roupa e levava
tudo para os mais necessitados. Enaltecer apenas seu trabalho fica fácil, mas é
preciso que todos saibam o grande “cara” que ele foi. Vai estar eternamente em
nossos corações.
As
fotos que contam do blog são de autoria de Felipe Forzley e colhidas na
internet.
Um comentário:
Caro Marco Aurelio: Parabéns por essa merecida estória do Ernani postada por você meu caro.Certa vez no Jockey pela manhã ele me arguiu: Carrapito, você tem alguém para fazer manutenção nos video tapes do Senac? Respondi.Tenho alguns técnicos lá na Globo que fazem serviços fora do horário de trabalho.Ele me disse:Amanhã na gravação do programa (Globo Esporte) te procuro você me dá o contato. Fui embora, no dia seguinte fui trabalhar e me esqueci do combinado. Acabou a gravação e lá estava o Ernani na porta do VT na Globo me cobrando: E aí Carrapito cadê o nome do cara e o telefone? Me desculpei e disse: Ernani eu esqueci e ele retrucou: Só saio daqui com o contato do cara.Isto quer dizer: Comprometimento,profissionalismo. E o
Ernani como eu já havia comentado no Facebook, foi um dos mais completos profissionais que eu conheci e tive o prazer de trabalhar.Abração e continue sua jornada lá na cabine onde o mestre Ernani militou por tantos anos.Podes crer que lá tem bons fluidos. Antonio Carrapito
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