segunda-feira, 19 de março de 2012

Um “baixinho” com


10 metros de altura

Decidi colocar no ar este “matungão especial” pelo fato de sentir a necessidade de ter espaço para escrever sobre um dos melhores amigos que tive em meus 40 anos de ligação com o turfe. No blog semanal não teria como. Aliás, por falar na coluna, quando a criei, no jornal O Povo, em 1984, nos mesmos moldes de hoje, com estes mesmos tópicos, contei com o apoio e o incentivo deste amigo. Que, aliás, me incentivou em tudo que fiz ou tentei fazer. Na época, quis prestar uma homenagem a Haroldo Barbosa e seu “Pangaré”. Tive a honra de trabalhar com Haroldo em O Globo e decidi criar a coluna. Minha entrada no jornalismo aconteceu às avessas, pois comecei a trabalhar no jornal antes mesmo de fazer a faculdade. Resumindo, minha paixão pelo turfe me fazia querer ser tudo, menos jóquei (já era um pouco pesado). O que gostaria de deixar claro aqui é que em tudo que fiz, jornalismo, locução e treinamento de cavalos, contei com o apoio e o incentivo de Ernani Pires Ferreira. Sempre me dizia que fazendo o que se gosta, certamente conseguiríamos bom resultado. O talento é nato, mas a dedicação e o profissionalismo são fundamentais. Aprendi muito com ele, o profissional e mais ainda com o ser humano. Enaltecer o locutor (fantástico) é fácil, todos são testemunhas. Mas Ernani ia além.

Atitudes de um homem iluminado

Pensei muito antes de escrever sobre isso, pois além de ser assunto extremamente pessoal, me trás lembranças tristes, mas é preciso que todos saibam que Ernani era muito mais que um craque na profissão. No início de 2001 minha mãe foi diagnosticada com câncer e teve início uma luta insana. Mulher inteligente e forte, embora encarasse a doença de frente, se abateu e aos poucos foi perdendo a alegria. Mas, uma pessoa a fazia sorrir, por telefone e pessoalmente nas visitas que fazia. Quando o telefone tocava e ela atendia com um sorriso no rosto eu logo imaginava: “é o Ernani”. Sim, ele esteve ao nosso lado até o fim e segurou minha barra por um bom tempo. Posso também lembrar de que fez o mesmo em relação à minha tia, tanto que meu primo-irmão Felipe Forzley, que não tem nenhuma ligação com o turfe, adorava o Ernani e até fez inúmeras fotos dele e da equipe (meu primo entre outras coisas é fotógrafo premiado). Além de ser um amigo iluminado, tinha passado pela mesma coisa com um dos grandes amores de sua vida, a saudosa Vivi, que sofreu com a mesma doença. Aquele baixinho de 1,61 parecia ter 10 metros de altura e tirava forças não sei de onde para buscar palavras que, ao menos, amenizavam o momento difícil de encarar.

Um ser bem humorado e altamente profissional

A irreverência de Ernani, sempre brincando e fazendo piada, poderia passar uma imagem um pouco diferente da realidade. Ele foi uma das pessoas mais organizadas que conheci na vida. No meio da semana ia ao hipódromo pegar os programas oficiais (sempre pegava dois de cada) para já ter contato com os nomes dos animais inscritos. Certa vez, na diretoria do Senac, onde trabalhou por 18 anos, vi em sua sala uma quantidade incontável de pastas completamente alinhadas, por ordem alfabética. Onde morou, tudo no lugar certo. Ele sabia encontrar qualquer coisa. Uma vez deu um conselho ao treinador Valtemir Pedersen: sempre leve duplicata de qualquer coisa. Se uma falhar, você tem outra para resolver. E o Junior até hoje lembra disso e utiliza. Seu livro Guardanapos de Papel conta um pouco de sua história, mas garanto que mesmo querendo parecer não gostar de muitas coisas que citou, por vezes ele curtia.

Reconhecimento justo num ótimo trabalho

Num trabalho maravilhoso feito pelo repórter e amigo Victorino Chermont, Ernani contou um pouco de sua vida em programa mostrado em outubro do ano passado pelo Sportv. Victorino, turfista, amigo e admirador de Ernani, preparou uma matéria na qual o pernambucano continuava irradiando sua irreverência. Era tão detalhista que alguns podem não lembrar, mas em dado momento, quando falava sobre a criação de um de seus mais famosos jargões “Lá Vem o Juvenal”, um passarinho cantou e ele, prontamente, interrompeu o assunto e disse: “bonito isso”. Por falar em televisão, sua passagem pelo Globo Esporte, durante uma década, foi marcante. As crianças o reconheciam na rua e brincavam com ele. Também teve sua temporada no programa de José Carlos Araújo (seu amigo pessoal) aos domingos. Se for escrever sobre tudo que Ernani fez precisaria de umas dez colunas destas.

Frase que não esqueço

“Faça seu trabalho com total profissionalismo, receba seu dinheiro no fim do mês e vá curtir a vida” (Ernani Pires Ferreira)


O MATUNGÃO VIBROU

Creio que foi em 2005, não lembro bem. Luiz Carlos estava de folga e Ernani passou mal. Era um sábado e eu estava em casa, de bermuda, assistindo as corridas. Recebi uma ligação de Urubatan Medeiros pedindo que fosse narrar. Não fazia aquilo há pelo menos 20 anos e só havia transmitido corridas pelo rádio. Enfim, fui correndo e encarei dois páreos até o Luiz chegar. Ficou nisso. Mas, dois anos depois recebi uma ligação do Ernani dizendo que me queria a seu lado e ao lado do Luiz. De início relutei, mas diante da insistência dele acabei aceitando e no dia 28 de setembro de 2007 entrei para o time. Confesso que no início ainda estava um pouco inseguro, mas contei com total apoio dos amigos. Me recuso sempre a aceitar quando dizem que eu substitui Ernani. Não foi o caso e embora digam que ninguém é insubstituível, o baixinho é uma exceção à regra. Ernani foi único em tudo que fez. Como locutor, como ser humano, como amigo. Escreveu seu nome na história do turfe, na história da vida. Ajudou um incontável número de pessoas e jamais fez propaganda disso. Fazia doações a instituições de caridade, todo ano praticamente limpava o guarda roupa e levava tudo para os mais necessitados. Enaltecer apenas seu trabalho fica fácil, mas é preciso que todos saibam o grande “cara” que ele foi. Vai estar eternamente em nossos corações.

As fotos que contam do blog são de autoria de Felipe Forzley e colhidas na internet.

Um comentário:

carrapa disse...

Caro Marco Aurelio: Parabéns por essa merecida estória do Ernani postada por você meu caro.Certa vez no Jockey pela manhã ele me arguiu: Carrapito, você tem alguém para fazer manutenção nos video tapes do Senac? Respondi.Tenho alguns técnicos lá na Globo que fazem serviços fora do horário de trabalho.Ele me disse:Amanhã na gravação do programa (Globo Esporte) te procuro você me dá o contato. Fui embora, no dia seguinte fui trabalhar e me esqueci do combinado. Acabou a gravação e lá estava o Ernani na porta do VT na Globo me cobrando: E aí Carrapito cadê o nome do cara e o telefone? Me desculpei e disse: Ernani eu esqueci e ele retrucou: Só saio daqui com o contato do cara.Isto quer dizer: Comprometimento,profissionalismo. E o
Ernani como eu já havia comentado no Facebook, foi um dos mais completos profissionais que eu conheci e tive o prazer de trabalhar.Abração e continue sua jornada lá na cabine onde o mestre Ernani militou por tantos anos.Podes crer que lá tem bons fluidos. Antonio Carrapito